no evento de divulgação científica realizado pelo Núcleo de Pesquisa em Administração (NUPAD) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), nós apresentamos, a convite do Núcleo, a nossa pesquisa intitulada “Gestão da Diversidade Sexual: Responsabilidade Social Corporativa ou Gestão da Imagem?”, desenvolvida no âmbito do PEP-Rohm durante os anos de 2018 e 2019.
É comum que uma apresentação cause nervosismos, mesmo quando se trata de uma pesquisa já finalizada e de um tema sobre o qual nos debruçamos intensamente durante os últimos anos. Afinal, falar em público e apresentar o nosso trabalho para uma plateia diversa, composto de colegas docentes e discentes da UFRJ e de pessoas da comunidade externa, é um desafio, pois se trata de argumentar e comunicar de forma objetiva, em um curto espaço de tempo, sobre questões que tanto nos importam. Por saber do desafio que nos aguardava, nos preparamos, ensaiando durante o mês de outubro para que pudéssemos fazer uma boa apresentação em novembro.
Nós precisávamos encontrar a melhor forma de abordar não só a nossa pesquisa, com os seus processos metodológicos e resultados encontrados, mas também o tema, afinal, falaríamos de dentro e para dentro de uma das maiores instituições de ensino superior da América Latina. Instituição essa que é pública e detém um dos cursos de Administração mais bem conceituados do Brasil, tratando-se, portanto, de um importante centro de formação de tomadores de decisão na esfera pública e privada do nosso país.
Tendo em vista este local de onde falamos e com o qual se pretende dialogar, no país que mais mata pessoas transgênero no mundo e no qual a cada 19 horas uma pessoa LGBT é morta por crime de ódio, faz-se urgente abordar a LGBTfobia organizacional, bem como as ações de responsabilidade que são realizadas ou não por empresas em resposta a essa discriminação.
São muitos os desafios e as barreiras advindos de uma longa história de lgbtfobia estrutural e institucional que violentam e deixam cicatrizes na vida de lésbicas, gays, bisexuais, travestis, transgêneros e transexuais. E, para dar exemplos, poderíamos falar do acesso e permanência desses trabalhadores ao emprego em terras brasileiras, da sua ausência em empregos formais ou das violências sofridas e sequelas vivenciadas nos ambientes de trabalho quando se fazem presentes.
Discutir a diversidade sexual nas organizações trata-se de dar foco nessas questões presentes no ambiente empresarial buscando compreender as suas causas e construir soluções que sejam estratégicas, táticas e operacionais, integrando ações de curto, médio e longo prazo, a fim de que se possa transformar essa realidade. Para isso, se faz necessário um engajamento das pessoas em cargos estratégicos e de chefia, que deverão tomar decisões e implementá-las com a devida responsabilidade, sem desconsiderar a realidade externa às suas organização, implementando ações que incluam efetivamente a diversidade sexual nesses espaços. E o foco de nossa pesquisa a ser apresentada no evento era exatamente o de trazer para a discussão o desempenho das empresas com relação ao compromisso firmado com a diversidade e a inclusão.
No dia 12 de novembro, entretanto, a apresentação não ocorreu da forma que planejávamos. A vídeo chamada em grupo que realizávamos no Google Meet foi invadida de forma organizada e violenta por um grupo de criminosos virtuais que destilaram homofobia, transfobia, apologia ao nazismo e buscaram, de toda forma, inviabilizar a apresentação do trabalho do PEP-Rohm.
Foram alguns minutos que marcaram este momento de paralisia e revolta dos mais de 40 docentes, discentes e demais pessoas da comunidade externa à UFRJ que estavam presentes e que testemunharam a materialização, ainda que virtual, da LGBTfobia em nossa sociedade. Cabe ressaltar que em tempos de pandemia, espaços virtuais como esse se tornam a representação possível de espaços de encontros da UFRJ, quando encontros presenciais nas mediações de nossos campi ficam inviabilizados por questões de segurança relativas à pandemia.
Para muitos, o debate sobre a LGBTfobia, seja no âmbito organizacional ou não, é tido como algo distante, apreciado e compreendido no campo teórico, mas pouco tangível na prática, seja por conta da bolha de privilégio na qual alguns vivem, ou pelo fato de, por não serem pessoas LGBT, não vivenciarem nenhum tipo de agressão desse cunho no seu dia-a-dia ao longo da vida. Pois bem, todos os presentes, sejam eles pertencentes ou não à comunidade LGBT, vivenciaram, juntos, um ataque explicitamente voltado contra a comunidade LGBT, a sua causa, pauta e mais: contra o debate sobre estas questões no âmbito da Universidade Pública.
Aos que não estiveram presentes, os desdobramentos foram os seguintes: nós conseguimos criar uma nova sala virtual e migrar todos os convidados para um local seguro, inacessível para os criminosos fascistas que tentaram nos calar. Não conseguiram! No novo link, passados alguns minutos, necessários para respirar e recompor o foco, retomamos a apresentação e demos continuidade a esse debate tão relevante, agora mais latente, pulsante, efervescente nos olhos, falas e rostos de todos os presentes, inclusive nos nossos.
Para além dos resultados da pesquisa, que poderão ser lidos na íntegra por todos tão logo esta seja publicada, o nosso objetivo com essa apresentação foi trazer luz a um debate que envolve vidas, sonhos e o futuro de jovens LGBT+ em nossa sociedade, alertando para nossa responsabilidade, seja como discente ou docente, mas, sobretudo, como seres humanos, em combater os avanços da intolerância e do ódio à diversidade que vem ganhando ainda mais força e eco em nossa sociedade nos tempos atuais.
Ao lado de Mestre Rohm, intelectual brilhante e ativista dos direitos humanos que nos guiou e escreveu esta pesquisa conosco, aprendemos a importância de não nos tornamos apenas pesquisadores, estudantes ou profissionais. É preciso torna-se guerreiro(a) e encontrar em si a força necessária para enfrentar aqueles que querem nos calar. Trata-se de uma luta diária em que a atividade de pesquisa acadêmica consiste em pilar fundamental não apenas para o nosso desenvolvimento e formação, mas, sobretudo, como um espaço de batalha contra o ódio e a favor da primazia da vida.
Texto de José e Gabriel.