Em 2018, cursando IPS120, assisti um vídeo da Sherry Turkle chamado “conectados, mas sozinhos” e na semana passada eu reassisti. Nesse vídeo ela falou uma coisa que me deixou muito pensativa: “Acredito que estamos nos deixando levar a lugares que não queremos ir”. Imediatamente eu comecei a olhar ao redor e pra minha vida. Pensei na situação que vivemos no Brasil e no mundo e me perguntei: o que tenho feito para tornar o mundo melhor?
Eu comecei a pensar no poder que as redes sociais têm de nos alienar, de nos transformar no que não somos e de nos anestesiar. Isso me irritou muito! Eu sei que durante a pandemia esse foi o meio pelo qual as pessoas tiveram preferência em se comunicar massivamente umas com as outras, ao invés de fazer uma ligação, por exemplo. Só por conveniência (?).
Eu comecei a pensar nas pessoas que eu conheço e a me atentar para o fato de que elas estão online quase que 24h por dia. Isso é assustador, porque como a Sherry Turkle explica no vídeo, as redes sociais nos distraem de quem nós somos, do que nos machuca e nos entristece, nos distrai daquilo que poderia nos ajudar a nos mover para transformar nossas vidas e o mundo ao nosso redor. É muito parecido com a fala do agente Smith direcionada a Morpheus em Matrix. Eles estão na cobertura de um prédio e ele diz que a vista lá de cima é linda, dá pra ver as pessoas se distraindo enquanto estão sendo controladas e “vivendo” uma completa ilusão.
Antes de escrever eu pensei “mas todo mundo já está cansado de saber disso”. Mas também me perguntei porque é que não mudamos. Por que você não muda a sua vida? Por que eu não mudo a minha vida? Por que não mudamos a nossa sociedade? Está tão boa assim a vida aqui?
“O que mais importa é o controle de onde as pessoas colocam sua atenção”. Essa é outra frase que ela comentou no vídeo e me fez refletir, porque sabemos que existe uma batalha constante pela nossa atenção nas plataformas digitais, como refletimos no último post da coluna. Os algoritmos treinam a cada segundo do dia para descobrir aquilo que vai nos manter mais um minuto online, e mais um, mais um, mais um… Quando você se dá conta, já se passaram horas e ninguém fez nada de bom e útil. Eu não me importo que isso soe repetitivo. Acho que é fundamental repetir até que todos parem de fechar os olhos para vermos que estamos morrendo e mudemos de direção.
Um dos caminhos para que as coisas melhorem, a professora explicou e Mestre nos alerta há anos, é a desconexão. Parece, entretanto, que as pessoas têm muito medo de ficar sozinhas. O que me lembra conversas que tive com pessoas queridas sobre o medo e como ele nos aprisiona a lugares que não são nossos. Pode ser desconfortável em algum momento, mas a solidão é necessária pra que consigamos assimilar o que acontece conosco e com o mundo. É necessária pra que percebamos quem somos, o que nos amedronta, o que nos fortalece, o que desejamos.
O que acontece é que as pessoas fogem de si mesmas como se estar consigo mesmo, fosse a pior coisa do mundo. O que é curioso, porque quando não aprendemos a lidar com nossas luzes e sombras, também não aprendemos a lidar com as luzes e sombras das outras pessoas, o que faz as pessoas se esconderem umas das outras. Se tem algo que signifique estar sozinho mais do que isso, eu não sei o que é (mas é de uma forma ilusória). Acho que as pessoas gostam da ilusão. Isso explica vermos as pessoas falando da desilusão como algo ruim. Aqui entra a frase central de reflexão desse texto:
Quando li essa frase, eu percebi que não adianta sabermos que as redes sociais estão nos enfraquecendo, não adianta as pessoas reclamarem que a vida não está boa, que o país precisa melhorar e qualquer coisa do gênero. A única coisa que importa é saber se você realmente quer que o mundo melhore. Vocês querem que as pessoas tenham uma vida mais digna? Querem que as pessoas parem de passar fome? Que elas parem de morrer por amar alguém do mesmo sexo? Queremos isso mesmo?
O que temos feito pelo que queremos? Ao menos sabemos se realmente queremos isso ou se é só mais um discurso pronto que muitos repetem para manter uma ilusão de que “poxa vida, as coisas andam péssimas, queria tanto que tudo fosse melhor”, enquanto não movem uma palha pra que de fato algo mude? Não pretendo responder (realmente ou definitivamente) nesse texto nenhuma das questões levantadas (só avisando 🙂 ). Mas vou compartilhar as reflexões sobre os caminhos que tenho enxergado, podemos ir compartilhando uns com os outros.
Se realmente queremos que as coisas sejam diferentes, acho que devemos começar abraçando a solidão, de maneira sistemática, parando de fugir das sombras e fraquezas e encarando tudo isso para superá-las. Depois, é importante olhar para o lado, olhar para as outras pessoas, pra buscar o que é diferente daquilo que conhecemos. Uma das coisas que as redes sociais proporcionam com muita eficácia, é a padronização (pessoas que se tornam só mais uma coisa no mundo capitalista). Todos sabem o que devem ou não postar, fazer, pensar, para serem aceitos nessas bolhas ilusórias e venenosas. Mas é um perigo repetir aquilo que é igual em um mundo como o nosso, porque se repetirmos isso, nada nunca vai mudar (é meio óbvio, mas eu me pego ignorando o que é diferente do que estou acostumada a ver, fazer e ser com uma frequência preocupante).
Como Mestre Rohm já disse muitas vezes, só vemos aquilo que conhecemos, por isso é importante conhecer a si mesmo, para ser capaz de perceber a existência do outro e daquilo que é diferente, para poder expandir a percepção sobre o que pode ser real e irmos atrás de realizar.
Mas é muito mais confortável passar os dias como já estamos acostumados a passar. É mais fácil pensar em carreira, em família, em manter as coisas como estão. É mais fácil terminar de ler esse texto, concordar e depois esquecer o que foi lido e pensado, para continuar movendo a rodinha que mantém as coisas exatamente como estão enquanto reclamamos que queremos transformação. “Ai, mas o que adianta eu tentar fazer alguma coisa de diferente? Nada nunca vai mudar mesmo”, eu escuto essa frase constantemente (sério!). Esse é o jeito mais conveniente e antiético de se isentar da responsabilidade de fazer algo pela própria vida e pela coletividade.
É mais fácil culpar o sistema (sabemos que não é humano, por isso mesmo precisamos nos humanizar e trabalhar pra nos livrar dele, que nos desumaniza), culpar qualquer pessoa e não assumir as próprias responsabilidades. Somos ensinados a viver assim desde pequenos, sintomas da “educação bancária” que transfere conhecimento ao invés de fazer as pessoas criarem conhecimento, criarem a si mesmas e o mundo que desejam. Isso me lembra um outro vídeo que assisti graças ao Mestre, da Rita Von Hunt sobre o centenário do Paulo Freire. No PEP, aprendemos que não é por meio de uma educação bancária que visa o “progresso” (que, em verdade, significa manter as coisas como estão) que o desenvolvimento humano acontece. O que me lembra do primeiro post dessa coluna, sobre Mestre nos convidar a ver com nossos próprios olhos. Precisamos aprender a ver, mesmo que isso não seja confortável em muitos momentos. Só então poderemos aprender a viver.
Embora sejamos ensinados a “viver assim”, não significa que não devemos mudar. Se você está lendo esse texto, significa que falta de oportunidade de abrir os olhos é que não é. Uma outra coisa que eu costumo ouvir é “não tenho disciplina pra transformar nada”. Acontece que a disciplina é um exercício diário (e estou na luta contra mim mesma para me melhorar, porque eu sei que se não fizer isso vou ser só mais uma sombra pálida do que poderia ser). Aproveito para te convidar a ler ou reler os textos escritos aqui no blog, por Sofia e Gabriel, sobre essa temática.
Acho que a conclusão desse texto é o convite à uma autorreflexão, sincera, sobre quem você é e sobre como você tem contribuído para que o mundo continue tão injusto quanto está hoje. Às vezes a resposta pode ser que você tem escolhido não se conhecer, não aprender a ver, e a não se desenvolver. Embora pareça que isso só diz respeito a própria pessoa, diz respeito a todes porque vivemos em uma sociedade e o que acontece é impacta a todas e todos. Além de refletir para aprendermos a ver o que é diferente, nada vai mudar se não passarmos a agir diferente. Precisamos parar de deixar que sejamos levados para lugares que não queremos ir.