A experiência com Mestre no Congresso de Comunicação digital foi um sucesso!
Em termos de aprendizado, tive muitos exemplos de como se comportar nas mais distintas situações. Foi possível traçar uma síntese dos acontecimentos que compartilho com os queridxs para que todxs possam refletir acerca dos ensinamentos que tive oportunidade de presenciar recentemente.
Primeiro, é importante dizer que o evento ocorreu numa localização muito significativa para os cientistas debaterem o tema da Comunicação digital. Era um prédio lindo, feito de tijolos vermelhos, que abrigou uma estação de distribuição de energia no passado. Agora, no início do ano, em fevereiro, o imóvel foi alvo de protestos pelos moradores da região que lutaram contra a aquisição e instalação da empresa “Google” no edifício. Inclusive, Mestre esteve no protesto que suscitou no despacho da empresa de lá. Desde então, o local se tornou abrigo para eventos culturaux, sociaux e cientificos, e ventilou um ar fresco especial para o congresso.
No dia anterior, fomos à abertura feita pela poderosa Shoshana Zuboff em Urania, um teatro no centro de Berlim, onde ela apresentou e discutiu seu novo livro “A Era do Capitalismo de Vigilância” (2019), uma análise de “mão cheia” sobre o funcionamento do sistema capitalista atual. Aos que se interessarem, é possível encontrar vídeos sobre a palestra no Youtube. Foi uma grande apresentação, muito engajada em relacionar os conceitos com a realidade vivida no mundo atual, uma inspiradora abertura para o congresso.
No dia seguinte, o evento começou cedo e lá estávamos nós, assistindo as 3 séries de apresentações e perguntas dos cientistas e convidados. O público era em sua maioria formado por pessoas que apresentariam seus trabalhos. Haviam alguns convidados, mas todos pareciam se relacionar de alguma forma com a comunicação digital.
O início do evento decepcionou um pouco Mestre por conta de alguns trabalhos “fracos”. O número elevado de cientistas muito jovens incomodou e no dia seguinte teve até um caso “absurdo”. Dois verdadeiros Milênios, fizeram uma péssima apresentação. Além disso, a questão do “Mapa do evento” que mostrava de onde vinham os cientistas, revelou que não havia uma apresentação sequer de um cientista do “Sul Global”. Eram todos do Norte.
Apesar disso, tiveram sim trabalhos bons, feitos por cientistas sérios. Dos 25 trabalhos apresentados, Mestre gostou de uns 10. Os critérios para agradar foram, é claro, dependentes dos temas e produto da excelência nas diferentes situações. Mas, para título de análise, considero que os trabalhos que conseguiram relacionar os conceitos com a realidade foram os que mais agradaram. O grande problema dos trabalhos que Mestre não gostou foi que eles não tinham aplicação nenhuma no mundo vivido. Muitos tinham uma cara de supercomplexos, com muitos números e contas difíceis. Mas não tinham aplicabilidade no mundo real, com o que acontece na prática, o “agora” dos países ao redor do mundo (principalmente os do Sul global, que quase não foram citados). Muitos cientistas mostraram uma fé cega na tecnologia e um desconhecimento assustador sobre os acontecimentos do presente.
Foi interessante ver a reverência que Mestre fez aos empregados do evento. Desde o primeiro dia ele se relacionou com os trabalhadores que serviam a comida, conversou, sorriu, agradeceu e no fim teve a oportunidade de conversar um pouco melhor com eles. Durante a conversa descobrimos que eles eram imigrantes que vinham da Síria, e estavam em Berlin para tentar uma vida nova. Eram dois meninos de uns 20 e poucos anos de idade, que disseram que estavam iniciando uma startup para fazer filmes. Mestre então decidiu contar sua história (que nem eu sabia). Contou que iniciara como vendedor de sanduíche natural na praia em Niteroi por uns 2 anos. Explicou que também teve uma juventude difícil, e como aos poucos foi crescendo na vida, até chegar aquele evento como cientista, professor doutor. Mostrou aos jovens trabalhadores como era possível mudar a vida e transformar o futuro com trabalho duro e propósito.
Além disso, adorei ver a forma como Mestre elogiou os trabalhos dos cientistas que gostou. Ele foi pessoalmente conversar com cada um, discutir, agradecer e incentivar os excelentes trabalhos. Fez duas ótimas perguntas na última sessão que foi muito boa. Um trabalho interessante que discutia a questão da verificação e certificação de identidades digitais para uma pessoa estar num determinado lugar… as barreiras que se criam para a realização do mundo na forma como ele é. A outra pergunta foi para um belo trabalho que usou análise de discurso para investigar mais a fundo um discurso de Mark Zuckerberg.
Não posso esquecer da aula que Mestre deu à uma cientista na hora do almoço do primeiro dia, quando eles discutiram sobre o porquê era importante a inclusão dos cientistas do sul global nas discussões, trabalhos e eventos. Foi uma série sem fim de argumentos para explicar que ele estava incomodado com o fato de não estarmos incluídos nem no evento e nem no trabalho dos que já haviam apresentado.
Aprendi muito nos dois dias com as conversas que Mestre teve com os participantes, os comentários e as atitudes com todos, desde os organizadores até os trabalhadores. Foi uma experiência inesquecível para mim como pupilo. Agradeço ao Mestre por ter me dado a oportunidade de comparecer ao evento com ele e pelos muitos ensinamentos que tive nos mais diversos aspectos possíveis.
De Berlim, um abraço a todxs queridxs,
Marcelo Canesin