Temos visto que o modelo do capitalismo atual, com ênfase no fluxo de produtos e capitais em escala planetária, tem ocasionado um uso dos recursos naturais de maneira destrutiva, além de gerar desigualdade social e concentração de renda.
O mais novo “produto” trazido pela globalização é a pandemia do Covid-19. Além de um problema de saúde pública para todos os países, observamos muitos decisores mais preocupados com a manutenção da economia do que com as vidas que estão sendo perdidas em larga escala. A ênfase na economia nos trouxe até aqui. Este é o melhor caminho a continuar seguindo, ou devemos repensar nossa relação entre as nações e com o planeta?
Nesta discussão sobre os caminhos pós pandemia, alguns teóricos tem compartilhado suas reflexões. Slavoj Zizek – filósofo esloveno – aponta que a crise deflagrada com o vírus, mas que poderia ter sido originada por outro fenômeno qualquer de ordem climática, por exemplo, deve nos levar a repensar como estamos vivendo no planeta e a buscar uma mudança radical.
Ressalta a ênfase que tem sido dada às flutuações dos mercados ao invés da preocupação com as pessoas e a necessidade de uma reorganização da economia global baseada na cooperação e na solidariedade globais.
Byung Chul-Han, filósofo coreano, radicado na Alemanha, aponta que talvez, pós pandemia, tenhamos a expansão do uso de big data e a instauração da vigilância em larga escala. O uso de tecnologias de vigilância estaria agora legitimado, tendo como referência bem sucedida o controle mais efetivo da propagação do vírus em países da Ásia, que já fazem uso destes controles rotineiramente, e cujos cidadãos são pouco críticos quanto à utilização dessas ferramentas. Para Byung, a soberania não está no controle de fronteiras, mas sim, no controle de dados.
Como explica Naomi Klein, autora de “A doutrina do choque”, o choque provocado pela situação de expansão da pandemia, com seu alto índice de contaminação e mortes, seria a oportunidade ideal para a instauração da vigilância digital sem limites.
Além disso, Byung destaca que deveria ser revista a produção de insumos. A terceirização da produção para alguns países, fez com que nesse momento a China fosse o maior produtor de máscaras e outros equipamentos médico-hospitalares, necessários para o atendimento da população e a Europa, atingida na sequência da Ásia, sofreu com a falta desses produtos.
Para Byung, o vírus não derrotará o capitalismo, e não fará a revolução. Ele acredita que os humanos devem sim, com alguma urgência, fazer a revolução, repensando de forma colaborativa, seu modo de vida para a sobrevivência da espécie e da Terra.
Yuval Noah Harari, filósofo israelense, enfatiza, assim como Byung, a possibilidade do uso de dados para o controle da epidemia. O risco que corremos todos é que, passada a emergência ou a crise, se decida por dar continuidade ao uso dos equipamentos de vigilância de dados. O problema é que, o uso não transparente destes dados, pode permitir que políticos e corporações façam uso destas informações para nos manipular e vender o que quiserem. Assim como ocorrido no caso da empresa Cambridge Analytica, que manipulou as eleições americanas de 2016, levando à eleição de Trump, tema este tratado no filme Privacidade Hackeada, comentado neste site em outro blog (“A comodificação do sujeito” por Ricardo Rohm).
Harari diz que os cidadãos devem ser empoderados, tendo acesso a informações verdadeiras e conhecimento para tomar as melhores decisões. Devem poder confiar nas autoridades públicas, na ciência e na mídia. Para ele, estes fatores podem garantir que as pessoas tomem as melhores decisões para cuidar de si e para avaliar as decisões que os políticos tomam num momento de crise. A vigilância digital autoritária certamente não é a melhor forma de garantir o controle da situação.
O filósofo israelense crê que a cooperação mundial deve ser a tônica para um mundo melhor. O isolamento dos países, como temos observado, restringindo o acesso, sem estabelecer formas de cooperação não é a melhor forma de combater a pandemia.
Como uma alternativa ao modelo capitalista, temos um modelo proposto por Kate Raworth, economista inglesa, que considera o equilíbrio entre as necessidades humanas e os limites do planeta.
Na teoria desenvolvida por Raworth, o chamado modelo da Rosquinha, em que fatores ambientais são considerados, e, em cujo ponto de vista, estamos produzindo algumas coisas em excesso – trazendo consequências como a poluição do ar, destruição da camada de ozônio etc. – e outras estão faltando como alimento, saúde e educação, por exemplo. A saída está no equilíbrio, o foco é passar a produzir de modo a garantir o básico para as pessoas.
Deveríamos ser capazes de produzir alimento, saúde, educação, voz política, igualdade social… Raworth destaca 12 fatores. Há 9 itens relacionados à ecologia que deveríamos restringir, entre eles mudança climática, poluição química entre outros.
Os limites da rosquinha indicam as necessidades do que devemos produzir e até onde ir: o desafio é buscar o equilíbrio. Kate Raworth inova ao propor um modelo que considera a possibilidade de continuarmos a existir como espécie e preservando o planeta.
O modelo proposto por Kate pode ser considerado como uma fagulha que nos alimenta a esperança, se tomarmos como certa a necessidade de uma reestruturação do modo de vida, considerado o modo destrutivo como temos lidado como espécie com planeta e do esgotamento do modelo capitalista de produção como alternativa.
Líderes veem as pessoas! Este é um aprendizado trazido e enfatizado no PEP. Precisamos sim, cada vez mais, de pessoas comprometidas com a mudança, líderes capazes de transformar o mundo para melhor, de maneira mais inclusiva, e respeitando o meio ambiente.